Jeddah – O casamento eterno do Mar Vermelho

“Fomos ao rio de Meca, pelejámos e roubámos (lutamos), e muito risco passámos”, escrevia no início do século XVI Gil Vicente, o primeiro grande dramaturgo português. O autor referia-se às investidas de Vasco da Gama e, particularmente, de Lopo Soares de Albergaria, que atacaram a cidade de Jeddah – ou Judá. A cidade da península arábica foi fortificada, primeiro pelos egípcios e depois pelos otomanos, para se defender dos portugueses. Da muralha, destruída já pelos sauditas em 1947 para expandir a cidade, restam ainda alguns vestígios, como a porta de Makkah (Meca) de coral calcário, que marca o início da estrada que conduz os peregrinos à cidade mais sagrada do Islão.

A segunda cidade do reino da Arábia Saudita, conhecida por “Noiva do Mar Vermelho”, com cerca de 3,4 milhões de habitantes, é considerada a capital económica e turística e, apesar de ser referenciada como a porta de entrada para Meca, constitui um dos centros mais fascinantes, cosmopolitas e liberais do país. O seu lema é “Jeddah Ghair” – que se traduz por “Jeddah é diferente” – e invoca uma narrativa que junta tradição e modernidade, associada a uma paisagem diversificada e arrebatadora. A localização da cidade, a cerca de duas horas de voo das principais capitais do Médio Oriente e do Norte de África, imprime-lhe a centralidade comercial e multicultural que detém desde o século VII, quando então se tornou um importante porto para as rotas comerciais do Oceano Índico.

No centro de Jeddah, no distrito histórico (que na antiguidade estava rodeado pela muralha desaparecida) classificado como Património da Humanidade, brilham as pedras de coral e as janelas de madeira usadas em muitos dos mais de 500 edifícios antigos, como a Casa Naseef, edificada por uma poderosa família de comerciantes e que mais tarde serviu de residência real do rei Abdul Aziz. A tradição arquitetónica distinta inclui residências construídas no final do século XIX pelas elites mercantis que utilizavam o coral para o combinar com outras influências das rotas comerciais.

Os inúmeros museus da cidade conservam as histórias e as lendas do mundo dos sultões, califas, reis e xeques da região. Um dos mais visitados da cidade, Abdul Raouf Kalil, acolhe uma mesquita e vários edifícios, cada um com antiguidades, artefactos e ilustrações que espelham, respetivamente, o património saudita, islâmico e mundial. Entre outros espaços museológicos estão o Al Tayibat, que reúne coleções privadas de valor cultural incalculável, e o mais recente museu de tecnologia digital TeamLab Borderless, na Praça da Cultura do distrito histórico, descrito como um mundo de obras de arte sem fronteiras que comunicam e se misturam e onde o coletivo de artistas Team Lab, fundado no Japão, quer os visitantes a vaguear, explorar e descobrir.

Tal como noutros países islâmicos, grande parte das mesquitas são visitáveis fora das horas de culto. Duas das mais impressionantes são a Al Shafee e a Al Rahma, esta última também conhecida por “mesquita flutuante”, assente em estacas em pleno Mar Vermelho. A própria cúpula, sobre um anel de vitrais, também parece pairar quando iluminada pela luz do sol.

A mesquita Al Rahma vê-se da marginal de Jeddah (conhecida por “corniche”), com cerca de 30 quilómetros ao longo do mar cristalino, onde se multiplicam cafés e restaurantes com cozinha local ou pratos internacionais, esculturas, galerias, parques recreativos exuberantes, centros comerciais modernos e até demonstrações de falcoaria. Uma atividade vibrante num dos espaços públicos mais apreciados pela população, que sempre se detém, sobretudo à noite, junto à fonte do Rei Fahd: uma imponente construção que lança água a uns impressionantes 312 metros de altura num espetáculo de luz e cor.

Na “corniche” percebe-se uma costa de areia dourada a sul e a norte de Jeddah, junto a um dos recifes de coral mais importantes e impressionantes do planeta. Nas praias imaculadas, de acesso público ou privado, sucedem-se atividades como o snorkeling, passeios de barco, parasailing e jet ski, entre outras. O Mar Vermelho é um ecossistema rico, diverso e único, incluído na candidatura dos “Corais do golfo de Aqaba e Mar Vermelho” à UNESCO, submetida em janeiro deste ano pelas autoridades sauditas.

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